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poeiraCast 312 – Os álbuns mais estranhos da Uncut

Com mais uma lista recente para inspirar, a de 101 discos mais estranhos de todos os tempos, da Mais

por Bento Araujo     08 fev 2017

Com mais uma lista recente para inspirar, a de 101 discos mais estranhos de todos os tempos, da Uncut, voltamos ao tópico “discos estranhos”, sob um novo ponto de vista.

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Tim Buckley: Voz como protesto e improviso

Com uma voz peculiar utilizada tanto como instrumento de protesto como de improviso, o destino de Buckley era ser admirado pelas futuras gerações

por Bento Araujo     03 ago 2015

Tim Buckley

Ele morreu aos 28 anos de idade, vítima de uma overdose de heroína. Sua carreira fonográfica durou menos de dez anos e foi um fiasco comercial na época, com Buckley partindo do folk para incorporar jazz, psicodelia, soul e música avant-garde em seus trabalhos. Com uma voz peculiar utilizada tanto como instrumento de protesto (em sua fase puramente folk) como de improviso (em sua fase experimental), o destino de Tim Buckley era ser admirado pelas futuras gerações.

Em 1994, quando Jeff Buckley tomava o universo pop de assalto, o NME publicava uma retrospectiva sobre seu pai, assinada pelo renomado Fred Dellar. No artigo, Fred escreveu: “Tim Buckley obviamente negligenciou o livro. Aquele que continha todas as fórmulas aceitas, com melodias e linhas vocais pertencentes aos reinos da realidade. Nem ele próprio sabia onde estava indo. Em termos de pop, aquilo foi loucura. Buckley e conformidade nunca poderiam coexistir”.

Tim Buckley começou na verdade negligenciando as influências tradicionais de sua geração: Woody Guthrie, Dylan, Joan Baez e Pete Seeger. Não que ele não gostasse deles, apenas preferia escutar John Coltrane, Miles Davis, Stan Kenton e rockers como Little Richard e Chuck Berry. “Tormento não faz música – essa é uma falácia do pop norte-americano, que saiu da música negra e do soul. Não importa o quanto uma pessoa branca é espancada, essa pessoa nunca terá uma alma como a de um negro”, declarou um jovem Buckley ainda nos anos 60. E espancamento foi o que não lhe faltou. Seu pai, um veterano da Segunda Guerra, lhe batia constantemente, indignado com sua beleza quase feminina. Sua mãe ao invés de ajudar alegava que o filho morreria jovem, como todo bom poeta.

Talvez querendo fugir da maldição materna, foi em meados daquela década de 60 que Buckley musicou alguns poemas do amigo Larry Beckett, com seu violão de doze cordas, pelos bares do sul da Califórnia, onde conheceu Jimmy Carl Black. Através do baterista chegou a Herb Cohen, empresário de Zappa e dos Mothers of Invention, um profissional com um aguçado senso de ousadia, responsável por carreiras de sujeitos como Lenny Bruce, Captain Beefheart e Wild Man Fischer. Através de Cohen, Buckley assinou com Jac Holzman, que lançaria a estreia em LP pela sua Elektra, Tim Buckley (1966). O New York Times não deu a mínima ao garoto de 19 anos, mas Jack Nitzsche e Van Dyke Parks perceberam que algo de novo estava surgindo no cenário.

Isso ficou comprovado com o disco de 1967 do novo compositor, Goodbye And Hello, álbum que impressionou Jac Holzman, que tocava o disco sem parar para quem visitasse o seu escritório. É em Goodbye And Hello que a voz de Tim Buckley começa a levar o ouvinte a lugares desconhecidos. George Harrison foi um desses ouvintes, que inclusive tentou convencer Brian Epstein a pegar um avião em Londres e ir até Nova York para “escutar algo realmente especial”. Epstein morreu antes de seguir o conselho de Harrison, enquanto Buckley se encontrava mais interessado em limpar as ofertas de álbuns de jazz das lojas de discos do que se tornar uma celebridade. Durante uma aparição no Tonight Show, o apresentador tirou uma onda com o cabelo de Buckley, que retrucou: “É realmente surpreendente, eu sempre pensei que você era feito de papelão”.

Foi nessa época que Buckley passou a se dedicar a coisas mais importantes da vida, como perambular pelo Village com um de seus ídolos, Fred Neil, ícone do folk. Neil dizia que Buckley comia, bebia e respirava música 24 horas por dia, e que não se surpreenderia se Buckley trabalhasse em acordes e melodias durante o sono, tamanho era o seu comprometimento com a arte de compor e tocar.

Holzman, empolgado, espalhava outdoors de Buckley pela Sunset Strip. O boss da Elektra sentia que naquele 1967, de muito sangue derramado no Vietnã, a figura atormentada de Buckley criava uma considerável ressonância, expressando uma angústia que não era totalmente nociva. Nas apresentações ao vivo Buckley parecia cada vez mais vulnerável e emocional. Sentia uma fobia em constatar sua força perante uma plateia. Passou então a rejeitar o seu público, simplesmente por perceber que era amado por essas pessoas. A falta de maturidade colaborava para o não aceitamento daquele tipo de atenção.

Outra frustração sua era o blues rock, tão em voga em 1968. Considerava Clapton e todos seus asseclas meros impostores, brancos ingleses que estavam roubando sem o menor respeito o que havia sido criado pelos músicos negros norte-americanos.

Miles, Coltrane, Monk, Mingus, Ornette Coleman e Roland Kirk. Foi isso que Buckley, seu guitarrista Lee Underwood e o vibrafonista David Friedman ficaram escutando numa espécie de retiro sonoro que fizeram em Venice, Los Angeles. Desse retiro surgiram os temas que fariam parte de Happy Sad (1969), trabalho que, como Astral Weeks, de Van Morrison, explorava um novo território dentro dos mundos do folk, rock, jazz e blues. Como o nome entregava, o disco servia como uma miríade de sentimentos antagônicos. Incoerente, como a confusa personalidade de seu criador.

Totalmente frustrado com letras de música e os limites da fonética tradicional, Buckley, armado de seu alcance vocal de quatro oitavas, buscou expandir sua arte e sua música cada vez mais, mergulhando nos mandamentos de Stockhausen, Luciano Berio, Iannis Xenakis e da diva Cathy Berberian. Impulsionado pela música que ouvia e inspirado pelas drogas que consumia, a criatividade de Buckley também chegaria a Lua em 1969. Num único mês daquele ano ele registrou material que apareceria em três de seus álbuns seguintes: Blue Afternoon, Lorca e Starsailor. “Eu cheguei mais perto de Coltrane do que qualquer um”, declarou Buckley sobre esse específico período de sua carreira. Chegou a cantar em diversas línguas, simplesmente por soarem melhor em determinado momento. Os tempos das canções não obedeciam mais uma regra, assim como a instrumentação, os improvisos e seu impressionante alcance vocal e emocional. Parecia que Buckley sentia que morreria cedo. Estava sempre correndo, com pressa em absorver cada vez mais as novas ideias que surgiam pelo caminho. Já o sucesso não o iludia – Buckley desejava que o mundo fosse atrás dele e não o contrário.

Blue Afternoon (1969) foi o que menos agradou seu criador, pois continha as composições mais palatáveis daquele período, justamente naquele que seria seu álbum de estreia pela Straight, de propriedade de Herb Cohen e Frank Zappa. Lorca (1970) continha o material mais radical daquelas sessões e era uma pioneira suíte de cinco temas, com dissonâncias e ousadia pelos sulcos. Serviu como um tapa na cara da porção mais folk e tradicional que o acompanhava. Depois de dois fracassos o único caminho foi apostar no disco seguinte, Starsailor (1970), que continha “Song to the Siren”, hoje o tema mais conhecido de Buckley, regravada posteriormente por This Mortal Coil, Robert Plant, John Frusciante, Bryan Ferry etc. Mas isso foi já no culto tardio ao artista. Em 1970 Starsailor passou despercebido. As vendas despencavam cada vez mais, assim como o público nas apresentações. O que aumentava era o uso de drogas e álcool.

Em 1972, com uma banda reformulada e apostando num R&B e até no funk, Buckley soltou Greetings from L.A., seu único trabalho lançado em LP no Brasil, três anos depois pela Continental.

Zappa e Cohen achavam que Tim merecia mais atenção do público e para isso era necessário “atualizar” a sua sonoridade. Assim saiu Sefronia, em 1973, pelo selo DiscReet de Zappa, uma combinação de baladas intensas, covers e funk-rock original. A resposta do público foi a mais hostil possível. Num show em São Francisco um garoto gritou: “Tim, você é um vendido!”. Buckley ficou arrasado, com o coração partido.

Amargurado e repleto de frustração, Buckley encontrava-se deprimido com sua carreira e com o estado do mundo em sua volta. Afastou-se dos amigos e da família, afundou-se em contradições e no mau humor. Seu último trabalho, Look At The Fool, no entanto, mostrava um artista mais relaxado e leve, fazendo rock e R&B sem compromisso. Na verdade ele estava mais preocupado com sua carreira no cinema, já que havia sido convidado a interpretar Woody Guthrie na cinebiografia Bound For Glory.

No dia 28 de junho de 1975, após uma apresentação em Dallas, Buckley voou para Los Angeles para descansar uma semana em casa, antes de seguir a Aspen para começar a filmar Bound For Glory. Mas dentro de apenas algumas horas ele estava morto, vítima de uma overdose de heroína, morfina e álcool. Tudo aconteceu acidentalmente na casa de um amigo, mas ex-companheiros da banda de Buckley até hoje acreditam que o músico foi vítima de um crime cometido por agentes do governo, ou pela maldição de Herb Cohen, seu empresário. Assim como Hendrix, Buckley morreu devendo dinheiro e deixou somente uma guitarra e um amplificador. A versão mais aceita de sua morte, no entanto, é a que Tim estava limpo e careta no fim de sua tour e seu corpo não aguentou o baque daquela dose de heroína. Outros alegam que foi puro acidente, já que o músico queria apenas celebrar o seu papel conquistado no cinema. A verdade é que a sua prematura morte não foi uma total surpresa para aqueles que o conheciam.

Teria Tim Buckley recriado novamente a sua carreira musical? Teria ele se tornado um astro de Hollywood perseguido por paparazzis? Ou teria ele sumido no ostracismo e em sua própria nuvem de frustração? O que poderia ter acontecido daria um bom filme.

O ESSENCIAL DE TIM BUCKLEY

Goodbye And Hello (Elektra, 1967)
Álbum revolucionário, mostrando um artista já maduro e confiante em seu segundo trabalho. Contém “Hallucinations” e “I Never Asked to Be Your Mountain”.

Happy Sad (Elektra, 1969)
Um álbum sem fronteiras, um oceano de possibilidades que marcou o início de sua fase experimental. É o seu Astral Weeks, lançado por uma espécie de Modern Jazz Quartet do folk.

Lorca (Elektra, 1970)
Segundo o seu criador, “um disco que você não pode simplesmente tocar numa festa”. O momento mais radical e (de um ponto de vista) sublime de sua fugaz carreira.

Starsailor (Straight/Warner, 1970)
Experimental e vanguardista, o disco se transformou num marco. O que Buckley fez com a sua incrível voz aqui certamente influenciou um dos maiores vocalistas do rock progressivo: Demetrio Stratos, do grupo italiano Area.

Greetings from L.A. (Straight/Warner, 1972)
Seu único LP lançado no Brasil trazia um time de estúdio de primeira (Chuck Rainey, Ed Greene etc.) e “Sweet Surrender”, um dos pontos altos e improvisados de seus shows.

Sefronia (Discreet, 1973)
Uma acessível combinação de baladas intensas, covers de Tom Waits e Fred Neil e funk-rock original. É o que traz a sua incrível versão de “Dolphins”, de Fred Neil. Belo ponto de partida para quem não conhece o seu trabalho.

Artigo originalmente publicado na pZ 59

pZ 59

Rainbow, Aphrodite’s Child, The Sonics, Tim Buckley, Tuca, Howlin’ Wolf e Muddy Waters, Billy Thorpe, rock sueco, Tages, Motörhead, Jackson C. Frank etc.

por Bento Araujo     31 mar 2015

RAINBOW
É sempre um grande prazer lançar uma edição da pZ com uma capa escolhida pelos leitores. Vocês votaram e escolheram o Rainbow como capa e matéria principal deste número 59. Ritchie Blackmore sai finalmente na capa e teve o período 1975-1984 de sua carreira passado a limpo. Foram dezenas de formações, frustrações e tentativas de chegar ao topo das paradas, mas o legado deixado pelo grupo jamais poderá ser subestimado. A fase com Ronnie James Dio fez do Rainbow um dos nomes mais influentes do heavy metal. Graham Bonnet protagonizou uma passagem relâmpago, mas deixou um disco irretocável. A fase Joe Lynn Turner mostrou um Rainbow melódico e mais adulto, produzindo três álbuns clássicos do AOR oitentista. E Doogie White foi o vocalista na curiosa volta do grupo nos anos 90, que também deixou um belo trabalho. No fim, o que prevaleceu foi a visão de Blackmore, ávido por buscar novidades e reciclar a sua banda de tempos em tempos. A matéria inclui a discografia comentada do grupo.

APHRODITE’S CHILD
Seria 666 um freak-out vanguardista da era de Aquarius? O disco preferido de Salvador Dali? O melhor disco do selo Vertigo? A obra progressiva/conceitual definitiva? O melhor orgasmo registrado em disco? A trilha sonora do fim do mundo? Ou apenas uma obra-prima à frente de seu tempo? Seja qual for a sua resposta, o disco de despedida do Aphrodite’s Child ainda tira o sono de muita gente…

THE SONICS
Eles são considerados precursores do punk e a banda de garagem definitiva. A verdade é que aquele som saía tão visceral, sem a menor polidez, porque era o que realmente sabiam fazer. E ainda sabem. A banda esteve no Brasil para comemorar seus 50 anos de estrada, então aproveitamos para relembrar a trajetória do grupo e cobrir a única apresentação deles no país.

TIM BUCKLEY
Ele morreu aos 28 anos de idade, vítima de uma overdose de heroína. Sua carreira fonográfica durou menos de dez anos e foi um fiasco comercial na época, com Buckley partindo do folk para incorporar jazz, psicodelia, soul e música avant-garde em seus trabalhos. Com uma voz peculiar utilizada tanto como instrumento de protesto (em sua fase puramente folk) como de improviso (em sua fase experimental), o destino de Tim Buckley era ser admirado pelas futuras gerações.

TUCA
Valenza Zagni da Silva, ou Tuca, como ficou conhecida, é um caso típico de talento perdido da música brasileira. Tentativas de resgatar e relançar seu pequeno catálogo são feitas constantemente por selos nacionais e estrangeiros, mas a luz no fim do túnel parece inatingível. O fato de Tuca ter morrido prematuramente, em 1978, dificulta ainda mais o processo. A pZ investigou esses fatos e publica um artigo especial sobre a autora do esquecido clássico Dracula I Love You, de 1974.

HOWLIN’ WOLF & MUDDY WATERS
Marshall Chess queria conquistar a América branca adolescente com o blues que era patrimônio da Chess. Estava de olho nos dólares daquele público que vinha fazendo a fortuna da Motown. Para isso, apostou na fusão de dois de seus maiores bluesmen com os sons psicodélicos da moda em 1968.

PÉROLAS ESCONDIDAS ESPECIAL 1965
Dessa vez preparamos um especial com álbuns subestimados que estão completando 50 anos de idade. Estrelando: Billy Thorpe and The Aztecs, Tages, Jackson C. Frank, Downliners Sect, Alan David e The Strangeloves.

E MAIS
Motörhead, Eddie and the Hot Rods, Daevid Allen, Back Door, Ultimate Spinach, Harvey Mandel, Andy Fraser etc.

pZ 16

Duane Allman, Vanilla Fudge, Tim Buckley, The Nice, Ten Years After, The Electric Prunes, Moby Grape, Them, Captain Beefheart, Amon Düül, Stevie Ray Vaughan, Zombies, Curtis Mayfield, Tom Zé, Euphoria, Strawberry Alarm Clock, O Peso etc.

por Bento Araujo     07 jul 2014

DUANE ALLMAN
São dez páginas dedicadas ao músico e a sua obra musical. Na matéria você confere uma discografia comentada dos trabalhos principais de Duane, detalhes sobre seu equipamento, seu encontro histórico com Eric Clapton, sua morte trágica e inesperada e como ele transformou um vidrinho de remédio no mais conceituado slide do mundo guitarrístico.

1967
Temos também um especial que aborda alguns clássicos esquecidos lançados em 1967: Vanilla Fudge, Tim Buckley, The Nice, Ten Years After, The Electric Prunes, Moby Grape, Them, Captain Beefheart, etc.

AMON DUUL
Uma pitada de Krautrock aparece na matéria do Amon Düül, uma banda/comunidade que deu o que falar na Alemanha dos anos 60 e 70.

E Mais: Stevie Ray Vaughan, Zombies, Curtis Mayfield

Capas Históricas: Todos os Olhos (Tom Zé)

Canções que Mudaram o Mundo: I Don’t Wanna Talk About It (Crazy Horse)

Pérola Escondida: Euphoria

Have a Nice Day: Strawberry Alarm Clock / O Peso

poeiraCast 49 – Os 60 anos do selo Elektra
por Bento Araujo     17 nov 2010