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Protofonia: Música livre, sem amarras estéticas e estilísticas

Foi uma agradável surpresa receber o LP A Consciência do Átomo, o novo trabalho do Protofonia. O trio brasiliense de música livre e instrumental superou todas as expectativas neste seu segundo disco, produzido por Pedro Baldanza (Som Nosso de Cada Dia)

por Bento Araujo     01 abr 2016

protofonia

Protofonia
Música livre, sem amarras estéticas e estilísticas

Foi uma agradável surpresa receber o LP A Consciência do Átomo, o novo trabalho do Protofonia. O trio brasiliense de música livre e instrumental superou todas as expectativas neste seu segundo disco, produzido por Pedro Baldanza (Som Nosso de Cada Dia) e lançado pelos selos Miniestéreo da Contracultura e Editio Princeps. A Consciência do Átomo passou semanas rolando constantemente aqui na vitrola da redação, então nada mais natural convidar os três integrantes do conjunto (André Chayb, André Gurgel e Janari Coelho) para uma conversa franca sobre música. (Agradecimentos especiais: Fabio Catelli).

pZ – É possível traçar um paralelo entre o primeiro disco da banda e o novo (A Consciência do Átomo), analisando a evolução natural das composições, dos integrantes etc.?

André Chayb – Sim. O primeiro disco traz composições mais viscerais e jazzísticas, são mais a cara da primeira fase da banda, antes do intervalo que fizemos entre 2010 e 2012. Em A Consciência do Átomo, utilizamos outros elementos nas composições, como a eletroacústica, o serialismo, ritmos brasileiros etc. O que não mudou, entretanto, foi o nosso modo de composição, sempre buscando os caminhos menos óbvios, sem preconceitos, tentando fugir das amarras estéticas e deixando a música fluir livre.

André Gurgel – No primeiro disco estávamos mergulhados na sonoridade da gravadora alemã de música instrumental ECM. Por isso, o jazz está mais presente. No segundo disco, nossa pesquisa musical já estava bem mais ampla, não só nos diversos ritmos, mas também nas frequências sonoras. Observando experiências de cimática, onde podemos visualizar as formas de cada som, decidimos mudar a afinação dos instrumentos para 432 Hertz, ao invés dos convencionais 440 Hertz da nota Lá. Esse interesse por diferentes frequências também é um grande diferencial entre os dois trabalhos.

Janari Coelho – No primeiro disco, trabalhamos toda a produção praticamente sozinhos, apenas com a ajuda do nosso parceiro Oldair Vieira, responsável pelo estúdio Zimmer-Collen. Marcelo Bacha, do selo carioca Editio Princeps, foi um grande parceiro. Ele lançou o nosso primeiro disco e nos incentivou a incluir participações no disco seguinte, o que nos levou a uma oportunidade inesperada, que foi ter o trabalho de produção musical do Pedro Baldanza.

pZ – Pode-se alegar que A Consciência do Átomo é um álbum conceitual, baseado na obra homônima de Alice Bailey?

André Gurgel – Não. Não é um álbum conceitual. Na verdade, esse livro abriu nossas cabeças antes da banda existir e, mais tarde, usamos o título para nomear uma das novas músicas. Como se trata de um tema intrigante, com uma forte carga sonora, resolvemos nomear também o álbum.
pZ– Como rolou o convite para o Pedro Baldanza, do Som Nosso de Cada Dia, produzir o disco?

Janari Coelho – Eu conheci o Pedrão na internet e foi uma experiência muito empolgante, pois ele é uma pessoa muito bacana e atenciosa. Sem muita demora, depois de vários papos descontraídos, eu, logicamente, apresentei a ele o primeiro trabalho do Protofonia. Enviei o CD, ele ouviu com atenção e me deu um belo feedback: relacionou alguns pontos positivos e disse que, se estivesse presente em alguns momentos das gravações e mixagens, com certeza daria os seus pitacos. Não hesitei em perguntar sobre a possibilidade de ele vir trabalhar no nosso novo disco, já que estávamos com a maioria das músicas do segundo disco prontas para serem gravadas.

pZ – Como foi a parceria com o Pedrão em estúdio e como foi tê-lo como uma espécie de guru durante as gravações?

Janari Coelho – Não é simples para uma lenda como o Pedrão conhecer alguém por uma rede social e largar seus afazeres para, apenas na base da confiança, vir para uma cidade que mal conhece, já que só tinha vindo para tocar e voltar. Ele topou porque realmente apostou que iria ser um bom trabalho de produção e que nós éramos pessoas que levavam o trabalho muito a sério. Quando ele chegou, o levamos aqui para a Asa Norte, onde fica o nosso estúdio, e já tivemos nossa primeira aula de produção musical. A visão que ele tem da parte instrumental é de muito bom gosto, ele nos perguntava, no meio do ensaio, se sabíamos o que queríamos dizer com isso ou aquilo. E, de vez em quando, perguntávamos se ele estava entendendo a nossa onda. Ele chama de “cachorrinhos” as tais pontes de convenções rítmicas e melódicas que criávamos no decorrer das músicas. Eles nos ensinou a ver se esses “cachorrinhos raivosos” que, para nós, eram apenas como perfeccionismos, funcionariam, tanto que, depois, a gravação foi bem tranquila. Ele nos ensinou, também, a chegar no estúdio sabendo realmente o que queríamos fazer, mesmo que algo novo aparecesse ali, na hora, e essa mágica realmente aconteceu em vários momentos da gravação do disco. Nas mixagens, outra aula: ele pedia que os instrumentos fossem captados da forma mais orgânica possível, para só depois adicionar os recursos dos programas, mas sempre sem exageros tecnológicos, forma que muitos técnicos de som, pelo menos aqui na nossa cidade, não gostam de utilizar.O Pedrão nos ensinou que o que importa é saber exatamente qual sonoridade a banda quer expressar. O resultado final nos deixou muito satisfeitos. É um disco com um excelente trabalho de produção e direção musical, até na masterização. Enfim, apesar de sermos um trio, A Consciência do Átomo é um disco bem coletivo com participação de grandes lendas do rock brasileiro, com destaque ao próprio Pedrão, que,toca em quase todas as faixas, ora com violões de 10 e 12 cordas, ora com o nosso Teremim – instrumento que utilizamos desde 2012, tanto em estúdio quanto ao vivo – e também nos vocais, sendo autor de uma das composições do disco (“Ventos Quânticos”).

pZ – A música livre e experimental que vocês praticam certamente sofreu influências do Grupo Um, e o tecladista Lelo Nazário aparece como convidado em A Consciência do Átomo. Como rolou a sua participação?

André Chayb – O Marcelo Bacha (Editio Princeps) sugeriu a participação do seu amigo Lelo Nazário no disco. Enviamos a pré-mix para o Marcelo e ele fez a ponte com o Lelo. O resultado é aquele maravilhoso trabalho de teclas que se ouve na faixa “Ambas Dúbias”.

Janari Coelho – Lelo ouviu e gostou, disse que iria fazer algo. Em questão de dias enviou os teclados já gravados e mixados por ele mesmo, no seu estúdio Utopia. Disse que era só incluir na mixagem da faixa e trabalhar apenas o volume. “Ambas Dúbias” é uma faixa bipolar e os teclados do Lelo intensificaram ainda mais essa bipolaridade.

pZ – O pop rock feito em Brasília, nos anos 80, acabou fazendo muito sucesso em todo o país, mas a cidade também foi celeiro de outros grupos e estilos musicais menos celebrados pelo grande público. Como é fazer música experimental e instrumental em Brasília?

André Chayb – O cenário da música instrumental é bastante limitado. A música instrumental geralmente é consumida mais como “música ambiente”, existem aqueles grupos tocando standards de jazz em restaurantes etc. A música instrumental autoral, então, só encontra espaço em alguns poucos festivais, geralmente com público reduzido. O Protofonia tem uma coisa legal, que é o fato de fazer uma música instrumental que agrada tanto a velha-guarda, fã de free jazz, rock progressivo etc., quanto a nova geração, que busca mais sinceridade no rock and roll.

André Gurgel – Brasília tem apenas 56 anos, sua identidade cultural ainda não está bem desenvolvida. É por isso que muitas pessoas ainda olham pelo retrovisor quando querem alguma referência de cultura brasiliense. Amúsica experimental ainda assusta muita gente em Brasília. É algo que incomoda muito mais por ser desconhecido do que por alguma crítica embasada sobre esse estilo. Mas é necessário o incômodo. É desse atrito que o novo se desenvolve e eu percebo que, aos poucos, estão surgindo ouvintes e grupos interessados em novas direções instrumentais, livres de velhas receitas.

Janari Coelho – Brasília é uma cidade complicada, principalmente no que se refere ao espaço físico em si. Costumamos chamar o famigerado “Plano Piloto” de “bolha”, um lugar onde o entretenimento é mais importante que a cultura, apesar de existir alguma diversidade cultural. Muitos músicos, artistas plásticos, atores e cineastas são de nível internacional e, apesar de viverem e respirarem sua arte, poucos conseguem pagar suas contas apenas fazendo isso. Nas cidades satélites do DF, que são como bairros de periferia, é realizada a maioria dos poucos eventos em praça pública, para o povo degustar cultura. No Plano Piloto, o centro da cidade,os espaços para a música ao vivo se restringem a alguns pubs que, infelizmente, promovem mais as ditas bandas covers. Se as opções para a música autoral já são poucas, para a música autoral instrumental, então, são quase inexistentes. Essa falta de espaço faz com que muitas pessoas que apreciariam este tipo de música acabem por se contentar com o que lhes é oferecido por pura falta de opção. Por essa razão, tocamos musica autoral apenas nas cidades satélites, quase que o tempo todo. O Protofonia já tem um público consolidado,mas ele está disperso,justamente pela falta de eventos voltados ao tipo de música que fazemos: música experimental e instrumental.Não temos eventos como, por exemplo, os festivais anuais que são feitos em Goiânia e, quando surge alguma oportunidade, é comum que a “panela de vidro” já esteja tampada. Estamos aqui ligados nos editais de festivais instrumentais pelo Brasil e o Protofonia está sempre aberto para convites.

pZ – A edição limitada em vinil de A Consciência do Átomo ficou primorosa. Ela ainda está disponível? Como os interessados poderão adquiri-lo?

André Gurgel -Sim, da tiragem de 300 cópias numeradas, ainda temos várias disponíveis. Lançamos o disco com a parceria do selo Miniestéreo da Contracultura (www.miniestereo.org) que fez a produção executiva e com a Editio Princeps (dronsz@gmail.com), ambos lançando pela primeira vez um LP. Quem tiver interesse em adquirir o vinil, pode entrar em contato pelo nosso e-mail: protofonia@gmail.com que atenderemos da melhor forma possível.

pZ – Quais são os planos para o futuro?

André Gurgel – Continuar lançando nossa música em vinil. Mostrar cada vez mais o nosso som por todo o planeta. Continuar desenvolvendo nosso sotaque dentro da extensa linguagem da música instrumental, e acima de tudo, alcançar a música livre.

André Chayb – Temos muito interesse em nos aprofundar mais ainda no estudo das frequências, dos harmônicos, dos ruídos e de como nossa música pode atingir as pessoas em níveis energéticos.

Janari Coelho – Estamos trabalhando na diagramação do encarte da versão em CD do disco A Consciência do Átomo, mais uma vez com a parceria da Editio Princeps e sob a produção executiva do Marcelo Bacha. O CD vai ter uma música inédita, que foi gravada após a conclusão da gravação do LP e, inicialmente, seria incluída em nosso próximo trabalho. A faixa se chama “Blavatskundum” e consiste em treze minutos de passeio pelos novos elementos nos quais estamos mergulhados, música brasileira com muita eletroacústica, progressivo e improvisação livre. O CD deve estar pronto no fim de maio. Estamos agora batalhando também um projeto de Fundo de Apoio a Cultura daqui do DF, para conseguirmos uma verba para fazer uma pequena turnê pela Europa.

Acesse facebook.com/protofoniatrio

Artigo originalmente publicado na pZ 65

pZ 65

MC5, Franco Battiato, Doug Sahm, Lodo, Arcadium, Badlands, Psicodelia Britânica, Protofonia, Buffalo Springfield, Pretty Things etc.

por Bento Araujo    

MC5
O clima é de revolução sonora, já que o MC5 adorna essa importante edição da pZ. A banda de Detroit teve uma trajetória única dentro da história do rock e muitos dos altos e baixos protagonizados por eles estão neste número. Sendo jovem e vivendo num subúrbio de Detroit, no início da década de 60, você contava apenas com algumas opções: ir para o colégio, para uma fábrica de automóveis ou para o Vietnã. Somente uma outra opção anulava essas três acima: o rock ‘n’ roll. Foi essa a opção de três rebeldes garotos: Fred “Sonic” Smith, Wayne Kramer e Rob Tyner – todos prestes a fundar o grupo de rock que seria a encarnação definitiva do espírito da cidade de Detroit, assim como os Beach Boys encarnavam o espírito da Califórnia e o Velvet Underground, o espírito de Nova York.

BEHIND THE IRON CURTAIN
Os primeiros shows das grandes bandas de rock por trás da Cortina de Ferro!
Após a beatlemania e a Invasão Britânica de 1964, o mundo jamais foi o mesmo. Nos quatro cantos do planeta, o fenômeno do rock ‘n’ roll tomava os jovens de assalto. Nem mesmo o hermético bloco socialista do leste europeu passou ileso a tamanha revolução. Logo havia uma demanda para apresentações de artistas internacionais do lado de dentro da Cortina. A pZ investigou as aventuras de alguns pioneiros que se aventuraram do lado de lá do muro de Berlim, algumas décadas antes dele vir abaixo. Estrelando: Rolling Stones, Beach Boys, Zappa, Deep Purple etc.

PROTOFONIA
Foi uma agradável surpresa receber o LP A Consciência do Átomo, o novo trabalho do Protofonia. O trio brasiliense de música livre e instrumental superou todas as expectativas neste seu segundo disco, produzido por Pedro Baldanza (Som Nosso de Cada Dia) e lançado pelos selos Miniestéreo da Contracultura e Editio Princeps. A Consciência do Átomo passou semanas rolando constantemente aqui na vitrola da redação, então nada mais natural convidar os três integrantes do conjunto (André Chayb, André Gurgel e Janari Coelho) para uma conversa franca sobre música.

DOUG SAHM
Explorador musical não conformado desde antes mesmo do rock existir, o sujeito mais cabeludo de todo o Texas dos anos 60, englobou todas as tendências culturais do seu estado: blues, hillbilly, bluegrass, rock e a música tradicional mexicana da fronteira. Depois de uma temporada em São Francisco, ele voltou a Austin para se tornar o cowboy cósmico definitivo (junto com Gram Parsons), apagando qualquer preconceito entre a fusão do country com o sonho hippie, ao lado de seu Sir Douglas Quintet. Depois de alguns hits mundiais, saiu em carreira solo (sempre acompanhado de amigos ilustres) e fundou o “Traveling Wilburys do Tex-Mex”: The Texas Tornados.

O LADO B DA PSICODELIA BRITÂNICA EM DEZ COMPACTOS
1967. O ano chave do Verão do Amor, de Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band e da explosão psicodélica. Nos EUA, São Francisco vira a terra prometida, com Grateful Dead, Jefferson Airplane, The Charlatans, Moby Grape, Quicksilver Messenger Service, Tripsichord Music Box, It’s A Beautiful Day, Big Brother and the Holding Company etc. Na Inglaterra, os próprios Beatles já tinham impulsionado a revolução, com Revolver, no ano anterior, quando outros nomes como Donovan, The Yardbirds e Cream também embarcavam na onda lisérgica. Quando 1967 chegou, a Inglaterra foi tomada pelo sonho technicolor através do Soft Machine, Pink Floyd, The Jimi Hendrix Experience, The Move, Tomorrow, Traffic, Blossom Toes, Art, Nirvana, Kaleidoscope, Family, The Iddle Race, The Creation e até grupos que flertaram ambiciosamente com o gênero: The Rolling Stones, The Small Faces, The Hollies, Bee Gees, The Pretty Things, The Who, Eric Burdon & The Animals, Moody Blues, Procol Harum, The Incredible String Band e Status Quo. Mas, no meio dos elepês desse pessoal, foram lançados alguns compactos cruciais, verdadeiras pérolas da psicodelia britânica que acabaram sendo deixadas de lado com o passar das décadas. Em muitos casos, esses sete polegadas acabaram sendo os únicos lançamentos dessas bandas e artistas, que jamais contaram com a devida consagração e reconhecimento. A pZ resolveu então mergulhar fundo e escavar dez obscuros compactos psicodélicos, lançados no segundo semestre de 1967, celebrando assim um dos períodos mais criativos do rock britânico.

FRANCO BATTIATO
A longa e produtiva carreira do italiano Franco Battiato é pontuada pelo entretenimento garantido ou pela incerteza atroz. Seus discos lançados a partir de 1978 são de um pop certeiro e dançante, enquanto que sua fase anterior, vanguardista e experimental, só foi devidamente digerida depois que ele foi taxado de gênio pelo, digamos, conjunto da obra. A fase que mostramos nessa edição é a mais difícil e compreende seus primeiros LPs lançados pelo selo italiano Bla…Bla.

LODO
Nosso colaborador Nelio Rodrigues investiga a obscura banda carioca Lodo, que não deixou nenhum disco gravado, mas foi importante para o rock brasileiro dos anos 70.

ARCADIUM
O Arcadium é a quintessência do grupo obscuro. Quase nada se sabe sobre a história de seus músicos ou mesmo o que aconteceu com eles depois que resolveram passar a régua. Gravaram um LP, um single, participaram de duas coletâneas sem músicas inéditas e caíram no ostracismo.

BADLANDS
Entusiastas das grandes bandas de rock dos anos 70, os quatro talentosos integrantes do Badlands tentaram trazer um pouco de musicalidade e competência à cena do hair/glam metal do final dos anos 80. Infelizmente os egos falaram mais alto e o grupo durou menos que cinco anos.

E MAIS:
Buffalo Springfield, The Numbers Band, Paul Kantner, The Beckies, Pretty Things, Costa Blanca, Lewis Furey, Dionne-Brégent, Keith Emerson, Maurice White etc.