Arquivo da tag: patti smith

poeiraCast 461 – Patti Smith

Uma das principais vozes do rock americano a partir de meados dos anos 70, a Poetisa do Punk, Mais

por Bento Araujo     02 jun 2021

Uma das principais vozes do rock americano a partir de meados dos anos 70, a Poetisa do Punk, Patti Smith, é o nosso assunto neste episódio.

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Preparamos uma playlist que serve como trilha sonora para este episódio, com músicas que indicamos durante o programa. Ouça aqui!

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poeiraCast 440 – Punk em 1979

Neste episódio conversamos sobre o que foi feito há 40 anos no punk rock e em seus desdobramentos. Mais

por Bento Araujo     20 nov 2019

Neste episódio conversamos sobre o que foi feito há 40 anos no punk rock e em seus desdobramentos.

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poeiraCast 361 – Melhores Discos de 1978

A conversa neste episódio é sobre o que de melhor foi lançado no ano de 1978, ou seja, Mais

por Bento Araujo     28 mar 2018

A conversa neste episódio é sobre o que de melhor foi lançado no ano de 1978, ou seja, há quatro décadas, período em que o punk e a disco music influenciavam vários estilos de rock, mas em que havia, na verdade, muita coisa acontecendo…

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poeiraCast 274 – CBGB

A lendária casa de shows nova-iorquina CBGB abrigou uma parte significativa do rock na segunda metade dos anos Mais

por Bento Araujo     06 abr 2016

A lendária casa de shows nova-iorquina CBGB abrigou uma parte significativa do rock na segunda metade dos anos 1970 e início da década seguinte, tendo importante papel na história do punk, da new wave e de outras vertentes. O CBGB é nosso assunto neste episódio.

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poeiraCast 263 – Melhores discos de 1975

Simplesmente os melhores LPs que completaram 40 anos de lançamento neste ano que se encerra. Em nossas opiniões, Mais

por Bento Araujo     09 dez 2015

Simplesmente os melhores LPs que completaram 40 anos de lançamento neste ano que se encerra. Em nossas opiniões, é claro.

Patti Smith no Vaticano

Papa Francisco convidou a cantora, pessoalmente, para uma apresentação natalina no Vaticano

por Lucas Lazarotto     07 dez 2014

Papa + PattiEm 1976, os EUA assistiram Patti Smith cantando a sua versão de “Gloria”, no Saturday Night Live. Assim como em Horses, Patti abria sua versão com a polêmica frase: “Jesus died for somebody’s sins, but not mine”.

Hoje pode parecer normal, mas naquele ano de 1976, aparecer em rede nacional de TV proferindo tal blasfêmia era algo inconcebível, ainda mais que tudo foi ao ar na madrugada do domingo de Páscoa.

Trinta e oito anos depois, o inusitado aconteceu, já que o Papa Francisco convidou a cantora, pessoalmente, para uma apresentação natalina, no Vaticano.

O evento será transmitido ao vivo para todo o mundo, isso se realmente acontecer, já que alguns grupos religiosos italianos estão fazendo de tudo para banir a cantora das igrejas. Em Nápoles, por exemplo, quatro dias antes do show no Vaticano, está agendada uma apresentação dela na Basílica San Giovanni Maggiore.

http://youtu.be/yy9fs3cndrQ

Entrevista com Lenny Kaye

Este bate-papo com o guitarrista do Patti Smith Group e curador da compilação Nuggets aconteceu em Amsterdã, no camarim do Paradiso

por Bento Araujo     14 out 2014

Lenny & Patti“Agora eu entendo a razão de você querer me entrevistar…”.
Lenny Kaye está folheando a poeira Zine com um sorriso estampado no rosto. Estamos no camarim do Paradiso, em Amsterdã, onde dentro de algumas horas ele fará a primeira de duas apresentações completamente sold out do Patti Smith Group.

O fato de Lenny Kaye ser um verdadeiro herói para este que vos escreve não é meramente musical, ou melhor, claro que é. Seja tocando guitarra, compondo e produzindo, seja compilando bandas de garagem obscuras dos anos 60 e lançando tendências, seja escrevendo nas mais conceituadas publicações de música do mundo; Lenny é “o” cara.

Em 2010, assistir ele cantar e tocar uma versão de “Pushin’ Too Hard”, dos Seeds, ao lado de Peter Buck (num show do Patti Smith Group em New Orleans) foi algo revelador, um momento de epifania garageira. Comento isso com Lenny, que apenas ri, com cara de satisfação. Estamos falando do cara que escreveu nos primeiros e mais importantes fanzines de rock dos EUA, que criou um novo filão na indústria fonográfica com Nuggets: Original Artyfacts from the First Psychedelic Era, 1965–1968 e que é o fiel escudeiro de Patti Smith há mais de quatro décadas.

Estou na frente do Paradiso, em Amsterdã, na hora marcada da nossa entrevista e ele passa por mim com uma sacola da loja de discos situada no outro lado da rua. Somos apresentados pelo tour manager e Lenny me leva para uma visita pelas entranhas da histórica igreja convertida pelos hippies em templo do rock n´ roll.

“Saca só o que eu comprei”, ele me diz em tom de pura descontração de quem é rato de sebos de discos. É um EP de Maria Callas, interpretando “Medea”: “em qualquer loja do mundo que eu vá os caras sempre me mostram compactos de bandas locais, de garage rock. Eu não aguento mais, é tudo igual”, ele confessa dando gargalhadas. Mostro também a ele as minhas recentes aquisições daquela tarde do verão holandês: Xit, Q65, The Motions. Troca de informações musicais com o mestre, que barato. Nosso bate-papo está a seguir, na íntegra…


poeira Zine – Originalmente você começou tocando acordeom, enquanto crescia na região do Queens e do Brooklyn, em NYC. Lá pelo final dos anos 50 você decidiu abandonar o instrumento e começou a colecionar discos. Fale um pouco sobre o início de sua coleção e seu interesse em garimpar discos.

Lenny Kaye – Eu tive a honra e o prazer de crescer junto do rock n’ roll. Uma de minhas primeiras lembranças de garoto é a de escutar Little Richard no rádio, com “Tutti Frutti”. Era muito engraçado, pois eu e minha irmã rolávamos no chão quando escutávamos aquilo. Vivíamos no Brooklyn (NYC) naquela época, onde acontecia uma efervescente cena de doo-woop, então eu sempre presenciava uns garotos mais velhos parados numa esquina, cantando, ensaiando melodias vocais. Foi um dos primeiros gêneros musicais que eu caí de amores. Como todo garoto, eu escutava também o que tocava no rádio. Os primeiros discos que comprei foram “The Purple People Eater” com Sheb Wooley e “It’s Only Make Believe” com Conway Twitty, os hits da época. Por volta de 1958 eu estava ganhando discos de presente de Natal e minha coleção começou.

pZ – Quando a guitarra entrou na sua vida?

LK – Eu sempre amei música. Meu pai tocava piano e acordeom, meu avô tocou bateria durante toda a sua vida, fato que, obviamente, eu só descobri depois que ele morreu. Sempre fui cercado por músicos e música. Nos mudamos para New Jersey e o acordeom não combinava muito com o tipo de música que eu escutava. Quando eu entrei para a High School, há exatos 50 anos, eu comecei a tocar guitarra e aprendi três acordes básicos. Logo os Beatles apareceram e eu pensei: “agora o jogo começou pra valer, não preciso mais ser apenas um cantor folk de fundo de quintal” (risos). No fim daquele ano eu montei a minha primeira banda, The Vandals. Tocávamos em bailes, nas repúblicas estudantis e em festas do colégio.

pZ – Mas isso foi antes ou depois de você lançar o seu primeiro compacto, como Link Cromwell?

LK – Os Vandals começaram em novembro de 1964, então isso foi antes do compacto. Um ano depois, o meu tio, Larry Kusik, que era compositor e escreveu “A Time For Us” do filme Romeo e Julieta e “Speak Softly Love”, do Poderoso Chefão, estava trabalhando com Ritchie Adams, dos Fireflies. Eles estavam envolvidos naquela cena folk e juntos escreveram uma canção de protesto. Logo estavam em busca de alguém para cantá-la e meu tio disse: “Hey, meu sobrinho canta, ele tem uma banda e está deixando o seu cabelo crescer” (risos). Então fui lá e cantei em duas canções: “Crazy Like A Fox” e “Shock Me”. Foi a primeira vez que entrei num estúdio de gravação. Longe de ser um hit, o compacto foi muito importante pra mim, pois me deu a confiança e a certeza que eu poderia ser um músico, mesmo com o meu nome verdadeiro não aparecendo no selo, já que gravei sob o pseudônimo de Link Cromwell.

pZ – E o The Zoo?

LK – O Zoo foi a minha primeira banda pop, onde tocávamos covers de sucessos da época. Fazíamos shows com, no mínimo, quatro horas de duração, festa após festa. Tocávamos muito soul e R&B, como Sam & Dave, Otis Redding, Four Tops, coisas da Motown etc. Naturalmente fomos progredindo com a cena musical e logo estávamos tocando material de bandas psicodélicas. De 1964 a 1968 eu estava no The Zoo, e foram esses os anos “Nuggets”. Com isso, vivenciei aquela música em primeira mão, escutando, tirando e tocando aquele material. Infelizmente não chegamos a gravar, pois não escrevemos muito material próprio.

pZ – Depois de ter se mudado para New Jersey você se tornou membro de fã clubes de ficção científica e, aos 15 anos, começou a escrever, publicando o seu próprio fanzine, Obelisk. Sobre o que você escrevia nessa época?

(Nesse instante Lenny me interrompe e, com cara de espantado, diz: “Belo trabalho de pesquisa o seu” – eu falei que sou fã do cara desde o início, nem vem).

LK – O mundo dos apreciadores de ficção científica do período fazia parte de uma estranha subcultura. Era compreendido por pessoas esquisitas e alienadas, que talvez não fossem populares o suficiente, socialmente falando. Nos fã clubes de ficção científica essas pessoas se encontravam. Era um bom cenário para aprender como escrever, como visualizar uma revista e como interagir com pessoas. Tem também o fato da ficção científica ser também, por si só, algo que expande a mente através de uma consciência universal, como vinha acontecendo com o LSD e a psicodelia. Era também um cenário onde boêmios poderiam curtir algo juntos e se encontrar. Foi muito bom ter tido contato com aquele pessoal, pois eu era também alienado no sentido de não ser um super aluno exemplar, ou um aluno esportista, como muitos dos meus amigos de colégio. Eu era apenas mais um garoto esperando se tornar um beatnik algum dia (risos).

pZ – Você chegou a conhecer o grande Greg Shaw, fundador do histórico fanzine Mojo Navigator?

LK – (empolgado) Fui conhecer Greg somente bem mais tarde, quando já éramos jornalistas escrevendo sobre rock nas grandes revistas. Foi legal porque acabamos comentando sobre as nossas similares raízes nos fanzines de ficção científica. Naturalmente, os fanzines sobre rock surgiram dentro daquele mundo dos zines de ficção. Paul Williams (nota: fundador da Crawdaddy e gigante escriba do rock, falecido no ano passado) também veio desse universo. Eram cenas muito similares. Quando comecei a trabalhar em lojas de discos, eu conheci muitas pessoas cuja única atividade social era a de adquirir e colecionar discos. Ás vezes você fica somente dentro deste mundo, mas, em outras ocasiões, você se aventura por fora dele, que foi o meu caso. Tive sorte de ser capaz de transformar a minha paixão em algo além, nunca me tornei um escritor de ficção, porém me tornei um músico que vai a lojas de discos, comprar compactos. Que loucura este mundo (muitos risos)…

pZ – Então você passou a resenhar discos na revista Jazz and Pop. Qual foi o seu primeiro grande artigo publicado?

LK – A minha primeira resenha foi sobre Ogdens’ Nut Gone Flake, do Small Faces. Lembro da primeira frase: “Como você descreve uma experiência excêntrica?” (risos). Eu era muito pretencioso. Era muito excitante trabalhar para a Jazz and Pop – eles me davam o disco de graça e ainda me pagavam 25 dólares pela resenha. Trabalhei lá por um ano e lembro de escrever um artigo interessante chamado The Best Of A Capella, sobre uma pequena cena musical que acontecia em três estados que rodeavam New YorK: New Jersey, Philadelphia e Connecticut. Eram como os grupos de doo-woop que ensaiavam nas ruas, sem instrumentos, apenas voz. As lojas de discos prensavam os LPs desses grupos que cantavam a capella, e esses discos só poderiam ser adquiridos nas regiões onde aquelas bandas atuavam. Eu gosto muito desses discos e os coleciono até hoje. Como eu era um dos poucos jornalistas cientes daquela cena tão pequena e modesta, me senti na obrigação de escrever sobre aquilo.

pZ – E essa matéria mudou a sua vida, certo?

LK – Absolutamente. The Best Of A Capella foi publicada na Jazz and Pop e foi por causa dessa matéria que uma garota chamada Patti Smith me ligou dizendo: “Eu li o seu artigo. Eu também gosto bastante desse tipo de música e o que você escreveu me tocou”. Convidei Patti então para vir até a loja de discos em que eu trabalhava, no Village (nota: a Village Oldies, que depois mudou de nome para Bleecker Street Records, fechada recentemente). Jogamos muito papo fora, colocávamos os nossos discos favoritos e dançamos muito por lá. Se não fosse isso, eu não estaria sentado com você aqui neste instante. Um dia ela me contou que estava lendo poesias em sessões abertas ao público e que gostaria de agitar um pouco as coisas ao acrescentar uma guitarra elétrica ao fundo das poesias. Como eu tocava guitarra, me ofereci, então fui visitá-la e começamos a trabalhar juntos. Na época, Patti morava com o fotógrafo Robert Mapplethorpe. Foi o começo de nossa banda.

pZ – Depois você passou a escrever em publicações maiores, como Fusion, Crawdaddy, Rolling Stone, Melody Maker e Creem; e também foi editor da Rock Scene e da Hit Parader. Quais são as lembranças mais bacanas dessa época?

LK – No começo dos anos 70 existia uma pequena, mas assídua, comunidade de escritores de rock em New York. Evidentemente eu estava feliz o bastante por fazer parte daquela comunidade. Era possível ir a festas e encontros de imprensa e conhecer muitos outros jornalistas e escritores. Assim, era possível também escrever para diversas publicações simultaneamente. Cheguei a escrever usando três nomes diferentes. Ou você levava aquilo muito a sério, ou se divertia à beça. Para mim, a parte mais importante de escrever é ter certeza de que você é tão musical quanto aquilo que está escrevendo. Sua missão é transmitir ao leitor a impressão de como é a música, e não apenas os fatos “secos”. Você quer trazer a música para o mundo. Escrever sobre música é uma arte. Aprendi muito com caras que eu lia, como Paul Williams, Sandy Pearlman e Richie Meltzer; figuras que sentiram-se na obrigação de levar a escrita rock além do jornalismo, utilizando uma abordagem/linguagem artística em relação à música. É algo que eu sempro tento alcançar, até hoje. Ainda escrevo bastante e mantenho um diário de turnê no meu site. Gosto de voltar das excursões, algo bem social e público, e me trancar no porão da minha casa, com ninguém me dizendo onde devo ir (risos). Acredito que as palavras podem ser como música. Quando você escreve um grande parágrafo, existe melodia e ritmo ali.

pZ – É possível traçar um paralelo entre o Lenny Kaye escritor e o Lenny Kaye músico?

LK – Bom, eu sempre curti muito escrever. Ao contrário de uma performance musical, escrever é algo que você pode fazer com calma, ou seja, pode pensar a respeito da sua relação pessoal com a música. Tenho alma de historiador, portanto eu aprecio escrever sobre a história da música. Parte do meu cérebro é de um escritor: posso analisar e pensar sobre o assunto; e parte do meu cérebro é de um músico. Não sou um sujeito com erudição musical, mas meu verdadeiro talento é o de sentir a música. Quando estou tocando, não estou pensando em notas musicais, escalas etc. Apenas estou lá com a música, sentindo-a como ondas em movimento. É assim que eu me comunico com Patti no palco. Não combinamos muita coisa antes do show, apenas sentimos a presença do outro.

pZ – Quando você produziu o compacto de estreia de Patti Smith (“Hey Joe” / “Piss Factory”), foi como comprar o bilhete de um selvagem passeio de montanha russa ou foi apenas mais um dia de trabalho?

LK – Nós definitivamente sabíamos que tínhamos um público. Não éramos uma banda de rock. Somente nós dois e um pianista. Tocávamos em locais estranhos, abrindo para artistas folk. A questão era como captar em disco aquele tipo de performance artística que vínhamos executando. Ir até o estúdio e registrar uma versão de “Hey Joe” foi realmente um experimento pra gente. Depois de gravar “Hey Joe” tivemos apenas 15 minutos para matar “Piss Factory”, antes que nossa sessão de três horas de estúdio acabasse. Apenas tocamos e estávamos muito excitados em ter um single. Creio que ainda é algo que represente o que a gente estava fazendo naquela época. Não pensávamos em ser uma banda de rock. Em retrocesso, é óbvio que estávamos evoluindo para isso acontecer, mas estávamos tão fora do mainstream que não tínhamos ideias fixas sobre como apresentar o nosso trabalho a um maior público. Demorou ainda um tempo para outros instrumentos serem adicionados e tudo ficar integrado. Foi um período de conhecimento e aprendizado, inclusive emocional e pessoal. Claro que Patti é tão carismática e poderosa como performer que foi somente uma questão de ter certeza que a porta estava aberta para ela passar com tudo e ampliar cada vez mais o seu público.

Kaye com David Johansen e Dee Dee RamonepZ – Horses (1975), Radio Ethiopia (1976), Easter (1978) e Wave (1979). Fale um pouco sobre cada um desses álbuns da primeira fase…

LK – Eu costumo alegar que esses quatro discos formam a nossa primeira encarnação como Patti Smith Group. Eles estão amarrados de alguma forma, um ao lado do outro. Cada um deles carrega um senso de localização, de onde estávamos, mas também de movimento, de onde queríamos chegar. Horses tenta retratar exatamente como a gente era ao vivo: ingênuos e ansiosos. Foi um experimento muito interessante, como um drama psicótico, mas que não representava totalmente a nossa força e poder de fogo, que mostrávamos no palco. Radio Ethiopia parecia mostrar que tudo havia mudado, depois de um ano de shows e tours, sabíamos como nos portar como um grupo de rock, com volume e atitude. O teor experimental ainda foi mantido, na medida do possível.

pZ – Os diferentes produtores que vocês trabalharam nesses discos influenciaram o resultado final de cada um deles, não é?

LK – Exatamente, a escolha dos produtores reflete todas essas diferenças entre esses trabalhos. Em Horses, John Cale estava muito preocupado em manter a nossa arte intacta, ele entendia o nosso intuito, artisticamente falando. Jack Douglas, que produziu Radio Ethiopia, apesar de também entender isso, desejava apenas deixar o nosso som poderoso como sentíamos que ele realmente era. Depois que Radio Ethiopia saiu, Patti caiu do palco e sofreu graves lesões, então tivemos mais tempo de preparar o álbum seguinte. Em Easter, trabalhamos arduamente com Jimmy Iovine. Foi uma ressureição, algo como voltar a nossa forma original. O objetivo era apresentar um retrato fiel do que éramos. Num certo sentido é o nosso disco mais direto. Em Wave, Todd Rundgren tratou de buscar um desejo da banda, que era o de mostrar o nosso lado mais feminino, sensível e frágil, que refletia a dúvida de Patti na época, convencida de que havia conquistado tudo o que era possível com sua figura de rock n’ roller da década de 70. O disco tinha um ar de que “essa é a nossa despedida”, mas não muito. Era mais como uma mudança de um plano para outro.

pZ – E o que “amarra” todos esses álbuns?

LK – Pra mim, todos esses discos estão amarrados porque Patti começa Horses declarando “Jesus morreu pelos pecados dos outros, não pelos meus” e passa por todas aquelas questões nos trabalhos seguintes até alcançar a sua resposta na última faixa de Wave, onde ela está caminhando pela praia, conversando com o Papa. Foi uma bela jornada. Se tudo tivesse acabado ali, eu estaria feliz. Foi como um filme perfeito. Começamos tocando para 200 pessoas numa igreja, em NYC, em 1971, e terminamos em Firenze, em 1979, tocando para 70 mil. Não é possível criar um roteiro mais épico que este. Após aquilo, o tempo foi propício para mudanças: Patti estava indo para Detroit com Fred “Sonic” Smith e eu queria explorar outros caminhos. Nossa sensação era a de que havíamos cumprido a nossa missão nos anos 70.

pZ – E quase dez anos depois, quando todos menos esperavam, Patti voltou à ativa, mas com Fred “Sonic” Smith na guitarra, em Dream of Life (1988). Após a morte de Fred, você voltou como guitarrista e produtor em Gone Again (1996). Você encara isso como uma espécie de sobrevida da parceria musical entre você e Patti?

LK – Já faz quase 20 anos que atravessamos essa “segunda vida” e está sendo extraordinário para mim. Eu nunca esperava que isso fosse acontecer, mas estou muito feliz em poder excursionar pelo mundo e continuar a criar música com Patti. É algo muito gratificante e belo. Penso que não perdemos nada de nossos ideais e compromissos pelo caminho. Ainda somos aquela mesma banda dos anos 70 que se erguia e “balançava a bandeira” em prol do que acreditava.

pZ – A coletânea Nuggets marcou o surgimento de uma nova maneira de compilar pérolas musicais esquecidas do passado e foi ainda uma espécie de nascimento do movimento garage-punk, em forma de revival. Seu texto no encarte continha também um dos primeiros usos do termo “punk rock”. Você sentiu que estava fazendo história, ou você simplesmente não sabia o que viria a acontecer?

LK – Se eu soubesse que estava fazendo história eu tinha fudido completamente com tudo, simples assim. Eu estava apenas reunindo as minhas músicas favoritas, e, ao mesmo tempo, contando um pouco sobre o meu crescimento musical. Sob um certo ponto de vista, aquelas músicas eram ainda recentes, muitas delas haviam sido lançadas originalmente há quatro ou cinco anos, então eu não tinha ainda um conceito histórico sobre elas para me apoiar. Na minha opinião, aquelas músicas eram muito diferentes entre si. The Knickerbockers são totalmente distintos do Sagittarius, que é diferente do The Magic Mushrooms e do The Nazz (risos). É errado categorizar tudo aquilo como garage rock, um rótulo que só veio surgir depois. Evidentemente que existem traços de garage rock naquelas canções e que muitas delas eram bandas de garagem mesmo. Eu não usei essa definição “garage” no encarte, optei por usar “punk” simplesmente por questões de atitude, como ao categorizar um garoto arruaceiro e não um novo gênero musical. Algo do tipo “é isso mesmo, cara, nós temos esses três acordes e vamos dominar o mundo”. Aquilo tinha exclusiva relação com o acreditar em si mesmo, uma atitude que eu aprendi tocando em bandas, nos anos 60. O tempo passa e claro que hoje eu consigo visualizar o quão específico e importante foi aquela coletânea. Esteticamente, esse meu trabalho está por todo o lugar, mas não fui eu quem descobriu aquele tipo de música. Eu inclusive não sei tanto sobre aquelas bandas como o dono da loja de discos do outro lado da rua (risos). Cedo ou tarde, aquela música seria redescoberta. Graças à Elektra Records, eu apenas tive a oportunidade de reunir algumas das minhas escolhas pessoais em Nuggets. Eu sempre tento me certificar de que atrás de um simples conceito, ou rótulo, existem grandes canções e gravações.

pZ – Penso que para Jac Holzman, o chefão da Elektra, foi um verdadeiro pesadelo localizar quem eram os proprietários daquelas canções que acabaram entrando em Nuggets…

LK – Com certeza. Você deve imaginar como as coisas funcionavam naquela era pré-Rhino Records, ou seja: naqueles tempos antes da criação de selos especializados em reedições caprichadas. Muitos dos detentores dos direitos originais daquelas músicas eram completamente malucos, ou achavam que aquela era a chance definitiva de voltarem ao showbusiness. O primeiro passo de Jac foi contratar um bom advogado para a missão de renegociar tudo aquilo. Fico espantado como Nuggets, essencialmente uma compilação de oldies, é ainda lembrada com carinho ao redor do mundo. O que mantém Nuggets vivo são as bandas de garagem que sempre surgem por aí. O espírito que essas bandas carregam é o mais importante, o mais bonito e essencial legado daquilo tudo. Sou muito grato por ter feito parte disso.

Entrevista originalmente publicada na edição 52 da poeira Zine

Bento Araujo e Lenny Kaye, Amsterdam 2013

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Janis Joplin, Grace Slick, Fanny, Curved Air, Suzy Quatro, Runaways, Frumpy, Aguaturbia, Maggie Bell, Affinity, GTOs, Coven, Birtha, Girl Groups dos anos 60, Analogy, Babe Ruth etc.

por Bento Araujo     12 jul 2014

JANIS JOPLIN
O blues cósmico e solitário da cantora na época de seu primeiro álbum solo: I Got Dem Ol’ Kozmic Blues Again Mama! (1968).

GRACE SLICK
Com sua coragem e beleza, enfrentou de peito aberto a paz de Monterey, o amor de Woodstock e o horror de Altamont. Compôs e cantou hinos de uma geração; foi amiga de Janis e amante de Morrison; tomou mais drogas que Amy Winehouse e foi em cana mais vezes que Keith Richards e Lemmy juntos. Bem-vindo aos 74 anos de vida de Grace Slick.

FANNY
Elas não emplacaram nenhum hit, mas foram a primeira banda inteiramente feminina a assinar com uma major e conseguir projeção mundial. Gravaram uma sequência matadora de grandes discos, porém suas próprias virtudes jogaram contra: sexualidade não era parte da personalidade da banda. Falamos com três integrantes originais da banda!

CURVED AIR
Tudo sobre a banda da grande Sonja Kristina. Inclui discografia básica selecionada.

SUZI QUATRO
O maior fenômeno do glam rock feminino dos anos 1970 também marca presença imponente nesta edição da pZ. Do estouro de “48 Crash” até seus trabalhos mais recentes.

THE RUNAWAYS
A turbulenta trajetória da banda de Joan Jett, Lita Ford e Cherie Currie.

FRUMPY/ATLANTIS
A pZ desbravou a carreira da alemã Inga Rumpf, que passou por diversas bandas importantes do rock setentista.

AGUATURBIA
Eles lançaram apenas dois discos, mas entraram para a história como uma das bandas mais ousadas da virada dos anos 1960/1970. A pZ foi até Santiago, Chile, para conhecer de perto esse fenômeno psicodélico e entrevistar Denise e Carlos Corales.

MAGGIE BELL
Nossa pZ Hero da vez. Do Stone the Crows até a sua parceria com Jon Lord, passando obviamente por seus ótimos discos solo.

AS MUSAS DO ROCK BRASILEIRO
Celly, Wandeca, Rita, Baby, Gal, Luiza Maria e muitas outras.

100 MULHERES (OU BANDAS FEMININAS) MAIS SUBESTIMADAS DO ROCK
Uma lista épica, com frontwomans de bandas como Fifty Foot Hose, Opus Avantra, Zephyr, Mama Lion, Sweetwater, Cold Blood, Apoteosi; bandas inteiramente femininas como Daisy Chain, She, Cradle, The Shaggs, The Liverbirds, Isis e cantoras como Carmen Maki, Annette Peacock etc.

E mais:
Affinity, GTOs, Coven, Sandrose, Patti Smith, Birtha, Girl Groups dos anos 60, Analogy, Babe Ruth, Anjo Gabriel, Blackfoot, Humble Pie etc.

pZ 49

Golden Earring, Focus, Earth And Fire, The Outsiders, Cargo, Q65, Dust, Muscle Shoals, Goblin, Area, Guru Guru, Supersister etc.

por Bento Araujo    

GOLDEN EARRING
A pZ entrevistou, com total exclusividade, essa instituição do rock holandês. Tudo para contar a história dessa banda com mais de 50 anos de estrada. Os discos obrigatórios, o sucesso nos EUA e tudo sobre o show que assistimos deles.

FOCUS

O rock progressivo mundial nunca mais foi o mesmo após o sucesso de Moving Waves. Para falar sobre esse disco, e sobre toda a carreira do Focus, batemos um papo com o guitarrista Jan Akkerman.

THE OUTSIDERS

Por que o grupo de Wally Tax é considerado o melhor conjunto de rock surgido num país de língua não inglesa? Leia e descubra…

EARTH & FIRE

Prog sinfônico de primeira grandeza somado a beleza e ao talento inconfundível de Jerney Kaagman. A receita gerou uma das bandas mais imponentes do cenário holandês dos anos 1970.

Q65
Com Revolution (1967), o Q65 entrou para a galeria das grandes bandas de garagem do mundo. Tudo sobre esse clássico selvagem do rock sessentista.

CARGO

Se a Inglaterra tinha o Wishbone Ash, a Holanda teve o Cargo, que também marcou época com suas longas jams e seus ferozes duelos de guitarra dos irmãos Jan e Adrie de Hont.

CUBY + BLIZZARDS
O blues rock elétrico de Chicago não sacudiu somente a Inglaterra nos idos de 1967, bateu forte também nos Países Baixos, de onde surgiu este imponente combo liderado pela dupla Harry Muskee e Eelco Gelling.

GROUP 1850
Os mestres do rock psicodélico holandês, responsáveis pelo clássico Agemo’s Trip To Mother Earth (1968), também marcam presença.

COBERTURA EXCLUSIVA DE SHOWS NA HOLANDA
Nosso editor, Bento Araujo, passou uma semana na Holanda, onde assistiu shows de bandas e artistas como Van der Graaf Generator, Moody Blues, Golden Earring, Patti Smith, Black Crowes, Dexy’s Midnight Runners e Iron Maiden. As resenhas desses shows estão também nessa nova edição.

E mais:
Dust, Muscle Shoals, Goblin, Area, Guru Guru, Supersister, Livin’ Blues, The Motions, Shocking Blue, Trace, Kayak, Finch, Cosmic Dealer, Ekseption, Mr. Albert Show, After Tea, Alquin, Solution e muito mais.

Easter – Patti Smith

Patti Smith literalmente peitou não só lojistas rabugentos, mas também altos executivos de sua gravadora, eles que odiaram a capa de seu terceiro disco.

por Bento Araujo     11 jul 2014

patti-smith-easter

Patti Smith – Easter (1978)
Foto: Lynn Goldsmith

“Os lojistas não queriam vender o disco porque pêlos apareciam na minha axila. Fui advertida que, caso não apagasse os pêlos da capa, o disco não iria vender. Nunca tive interesse ou preocupação, com isso. Mudar Easter nunca passou pela minha cabeça”.

Patti Smith literalmente peitou não só lojistas rabugentos, mas também altos executivos de sua gravadora, eles que odiaram a capa de seu terceiro disco. Num mundo machista, uma axila feminina não depilada era uma grande afronta na cabeça dos machões caretas, um tipo de afronta que comprometeria até mesmo a venda do álbum. Ironicamente, Easter se tornou o disco mais vendido de toda a carreira de Patti Smith.

Se a foto de Robert Mapplethorpe que embalava a estreia de Smith em Horses (1975) foi considerada “uma das melhores fotos tiradas de uma mulher”, Easter seguiu num outro caminho. Talvez por embalar um trabalho repleto de alusões religiosas, cristianismo, morte e ressurreição.

A foto de Lynn Goldsmith estampada na capa de Easter retratava com extrema fidelidade a personalidade de uma artista única no cenário da época. Em 1978, a androginia levada a cabo por homens nos anos dourados do glam rock era passado. Cabia a Patti trazer essa androginia para o universo do punk rock. Capturada durante um gesto puramente feminino, como prender o cabelo com um grampo, Smith posou com naturalidade, erguendo seu braço esquerdo, deixando à mostra sua axila não depilada, um gesto puramente masculino. Uma contradição que a própria faz questão de explorar nos palcos, onde cospe no chão ao mesmo tempo em que explica “porque a noite pertence aos amantes”.

Falando nisso, “Because the Night” (co-escrita por Bruce Springsteen) foi o primeiro single extraído de Easter e se tornou o maior sucesso da cantora. Na capa do compacto, uma imagem da mesma sessão de fotos do disco, porém com a nossa protagonista de braços abaixados.

Lester Bangs resenhou Easter na época, escrevendo: “Querida Patti, comece a revolução sem mim”. Mal sabia ele que a revolução havia começado impulsionada por alguns inocentes pêlos.

Texto originalmente publicado na pZ número 50.

poeiraCast 156 – Holanda 2013, parte 2
por Bento Araujo     10 jul 2013